07 julho 2013

Que futuro para Portugal?

Sei que não devo alongar-me nesta alocução protocolar, mas não me perdoaria a mim mesma se deixasse fugir esta oportunidade sem uma palavra relativamente à situação particular do nosso País e às suas perspectivas de futuro.
É certo que as palavras anteriores subentendem essa preocupação e a leitura que vou fazendo da realidade. Reflectem o desgosto por estar a assistir a um processo evitável de empobrecimento colectivo em bem-estar e qualidade de vida para a generalidade dos cidadãos e cidadãs de todas as idades, por constatar que para vastos sectores da população portuguesa se estão a atingir níveis inesperados de precariedade material e risco de pobreza; o desemprego assume, cada vez mais, carácter estrutural dentro do actual modelo económico e atinge, hoje, um número anormalmente elevado e crescente de pessoas e famílias inteiras, algumas das quais privadas de qualquer apoio social, esgotado que foi o período fixado para o subsídio de desemprego.
Vejo com apreensão que crescem as desigualdades na repartição do rendimento e da riqueza e acumulam-se no topo da pirâmide incalculáveis fortunas socialmente improdutivas, o que, além do seu carácter de injustiça social, vem alimentando uma perigosa tensão sociopolítica e uma maior propensão à anomia social, com consequências sérias que prejudicam a desejada coesão social. estas situações estão diagnosticadas e estatisticamente avaliadas.
Convém, porém, ter presente que, por detrás dos números, que as estatísticas revelam, estão pessoas de carne e osso que se sentem descartadas e desconsideradas nos seus postos de trabalho, inseguras quanto aos seus rendimentos no futuro, injustiçadas nos seus direitos fundamentais. Há uma dívida social de que pouco se fala, mas que não cessa de crescer, enquanto os recursos disponíveis na economia são, em boa parte, aspirados pelos encargos com os juros pagos por dívidas aos credores.
A actividade produtiva em alguns sectores definha e, apesar de iniciativas pontuais de inovação e de êxito nos mercados internacionais, falta uma estratégia de conjunto, tecnicamente bem fundamentada e devidamente concertada a nível político, capaz de valorizar os recursos potenciais do País, incluindo os seus recursos humanos, de conhecimento e de organização e capaz de os adequar às necessidades da população e dos seus territórios e ao bem comum.
Se quisermos arrepiar caminho, teremos de começar por colocar no lugar certo as finalidades que, como povo, desejamos alcançar. Grande desafio este para a Ciência Económica que, assumindo-se como uma ciência de meios, não raro se dispensa de explicitar os objectivos visados e, menos ainda, se preocupa em os avaliar criticamente, à luz de critérios de Ética e de Justiça social.
No caso presente, esta é uma questão crucial para a política económica nacional e para o futuro do País. Uma certa obsessão com a dívida soberana e com o equilíbrio das contas públicas, custe o que custar, tem impedido que se estabeleçam objectivos e metas de desenvolvimento e se aclarem os contornos desse desenvolvimento e do modelo que lhe subjaz.
A tarefa estaria facilitada se, no âmbito da União Europeia, em que Portugal está integrado como estado membro de pleno direito, e particularmente se, no espaço da zona euro a que também pertence, soprassem ventos mais favoráveis dos que os actuais e fossem mais aperfeiçoadas as estruturas de governação e mais democrático o seu funcionamento. Todavia, mesmo com ventos adversos, não só é possível continuar a navegar como o navegador experiente sabe aproveitá-los em favor do rumo que deseja alcançar. É, pois, de navegadores informados e experientes que o país carece.
Ao contrário do que por vezes se procura fazer crer, Portugal é um País rico em recursos potenciais ainda por explorar; a sua população, sobretudo a mais jovem, adquiriu nas últimas décadas bons níveis de conhecimento científico e elevada qualificação profissional; dispõe de uma razoável organização social, incluindo uma vasta e diversificada rede de instituições de economia solidária e social; pode beneficiar de valiosos contactos à escala mundial desde que valorizados por uma diplomacia assertiva e convertidos em sinergias positivas; tem uma longa história como Nação e um vasto e rico património cultural. Todos estes recursos devem ser assumidos e colectivamente valorizados. Neles residem as perspectivas de um futuro melhor e não podem, por isso, ficar de fora do perímetro de uma Ciência Económica que incorpore a devida preocupação de utilidade social.
Reconheço que não está nas atribuições da Universidade substituir-se aos responsáveis políticos, aos governos e demais órgãos de soberania, mas como parte integrante da sociedade civil, particularmente qualificada que é, deve assumir a responsabilidade de fazer ouvir a sua voz produzindo conhecimento e tornando-o disponível à comunidade.
Aceito com humildade a atribuição do grau de doutor honoris causa que a Universidade Técnica de Lisboa entendeu por bem atribuir-me e faço votos de que esta sessão pública seja um contributo positivo, ainda que modesto, para construir um futuro mais esperançoso, para os nossos concidadãos e concidadãs, na rota da prosperidade, da justiça, da liberdade, da democracia e da paz.
Muito obrigada!
21 Junho 2013
Manuela Silva
NOTA: Parte final da intervenção da Dra Manuela Silva durante a Cerimónia de Atribuição do Grau de Doutor Honoris Causa da UTL.

1 comentário:

  1. É PRECISO QUE SE MANIFESTE EM TODA A AMÉRICA LATINA O DESEJO DOS CRISTÃOS CATÓLICOS PELA BEATIFICAÇÃO DO MÁRTIR ARCEBISPO DOM OSCAR ROMERO, DE EL SALVADOR!!!!!

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